

O “palavrão” originou-se em tabus criados pela religião e pela vida em sociedade. Tudo que se relacionava a homem, animal e sexo foi motivo de controle rigoroso dos religiosos. Os romanos foram os primeiros a propagar os palavrões, seja por meio de textos, canções e até inscrições em muros e paredes (teriam sido eles os primeiros pichadores?), embora no teatro grego antigo personagens poderiam proferir frases injuriosas, já que, sob atuação teatral ou embriaguez, âmbitos do deus Dioniso, era permitido ao cidadão cometer injúrias.Na Idade Média, as Cantigas de Escárnio e Maldizer tomaram esse lugar, com propósito de caricaturar o(a)
humilhado(a) destacando atributos físicos negativos, modos ou trejeitos (digamos que o bullying tenha aí sua origem). No ciclo medieval o demônio é personificado como algo monstruoso, assim como a feiúra é associada a ele – não ficando de fora os termos chulos. Segundo a Bíblia, “O que guarda a boca e a língua guarda a sua alma das angústias” (Provérbios 21.23), sugere que qualquer coisa dita que não enaltecesse Deus, era considerado ofensivo. Então, termos chulos eram sinônimos do demônio atuando através do locutor. Mas, que termos eram considerados chulos?
Uma série de gravuras passaram a representar a região do ventre e baixo ventre com uma fisionomia demoníaca: ali era a fonte do mal humano, de onde o mau odor, a sujeira dos excrementos e a tentação do sexo estavam reunidas. Muitas ilustrações medievais-renascentistas reproduzem da região do estômago até as genitálias exageradas e monstruosas, com faces demoníacas. Não seria diferente, tratando-se de termos chulos, suas origens dessas regiões, não é mesmo? Todos os palavrões passaram a ser associados ao sexo, práticas sexuais, prostituição, excrementos e evacuação. O mal ficara aderido à ideia do prazer, tanto no ato da cópula, quanto da eliminação da urina e fezes. Alguns termos foram sendo associados de outras culturas, mas sempre com o mesmo fim: denegrir o outro vinculando-o à “sujeira do sexo e do purgo orgânico”.
Uma verdadeira paranoia tomou conta da sociedade, já que o demônio espreitava todo tempo. Íncubos e súcubos,
bruxas e feiticeiras passaram a ser agentes ameaçadores através da luxúria, gula e esbórnia. Pronunciar um termo chulo, acreditava-se que era uma forma de invocá-los. As bruxas, quase sempre, se não eram velhas e feias, eram jovens e sensuais. Xingar alguém era uma forma de amaldiçoar. A masturbação era considerada infame. Em pouco tempo, caso desejasse mal à pessoa, bastava associá-la a fezes, origem de doenças, pobreza e malefícios. As ilustrações renascentistas apresentavam demônios com grandes pênis, vulvas deformadas, seios caídos e secos e ânus monstruosos. Os palavrões endossavam tais características e se misturavam a termos latinos, germânicos e árabes, incutindo a ideia de barbárie. Alguns termos chulos passaram a classificar indivíduos com alguma dificuldade cognitiva ou dotados de poucos recursos, como idiota, imbecil, cretino, miserável, fracassado, dentre outros.
4) Merda – no teatro antigo (e este uso estende-se ainda nos dias de hoje), merda era utilizada na linguagem entre artistas de teatro para desejar boa-sorte antes da entrada em cena. A expressão nasceu da língua francesa, merde, provavelmente no século XIX ou século XX, pelo fato de o público ter acesso à casa teatral por meio de carruagens a cavalos que, muitas vezes, amontoavam fezes em suas entradas; com ironia, a expressão correlacionava o fato de haver “muita merda” na entrada do teatro ao desejo de se ter também “muita sorte” em cena;
denominava a pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros das caravelas, de onde os vigias perscrutavam o horizonte em busca de sinais de terra. O caralho, dada a sua situação numa área de muita instabilidade (no alto do mastro) era onde se manifestava com maior intensidade o rolamento ou movimento lateral de um barco. Também era considerado um lugar de castigo para aqueles marinheiros que cometiam alguma infração a bordo. Mastro;
10) Vagabundo – do latim vagabundus, “pessoa que anda sem destino”, de vagare, “errar, andar ao léu”, mais o sufixo – bundus, “propenso a, cheio de”. Sua entrada no idioma é do séc. XIV.Bônus: dedo médio levantado – os romanos já tinham até uma expressão para descrever o ato: digitus
impudicus, que dignifica o dedo indecente.
Giancarlo Kind Schmid (oraculista, simbologista, psicanalista e professor).
