
A ilustração de Pamela C. Smith para o 10 de Espadas do (Rider) Waite-Smith apresenta uma imagem tenebrosa: um homem caído ao chão, com 10 gládios espetados ao longo de suas costas, encontra-se num solo lamacento que se mistura ao seu sangue, tendo ao fundo o amanhecer, como se, após tantas dores o sofrimento caminhasse para o fim. A imagem faz referência aos suplícios aplicados a centenas de pessoas por variados motivos (não só criminais), mas por vingança ou acusações políticas e/ou religiosas. Muitos países na Europa (a citar Inglaterra, Itália, Espanha, Portugal, Alemanha e outros) adotaram os suplícios principalmente a partir do século XVII, onde o objetivo não era apenas matar, mas humilhar o supliciado através das dores intensas impostas com fim de extrair-lhes confissões (muitas destas ocorrendo apenas por desespero e tormento). O título sugerido é “Suplício”.

Até o fim do século XVIII, o suplício era uma maneira de punir, simples assim, apenas uma das maneiras pelas quais o poder se aplicava sobre o outro. Não era a mais comum, mas… existia.
Em primeiro lugar, o suplício é a arte de causar dor: uma dor inexprimível, indescritível, inefável, pior que a morte. Se possível, uma dor que seja comparável a mil mortes. A medida desse sofrimento é designada de acordo com a gravidade do delito. Em segundo lugar, deve ser marcante, deve deixar uma marca no corpo, algo do qual o supliciado, caso sobreviva, nunca mais se esqueça: a perda de um membro ou uma cicatriz profunda. E terceiro, deve impressionar aqueles que o veem, os espectadores devem se lembrar para sempre o que os espera caso sejam condenados também. O corpo do supliciado é um corpo que se curva à justiça, ou melhor, trata-se de uma justiça que faz o corpo se curvar à força! Ele será alvo da fúria da lei e da ordem. O julgamento acontecerá longe dos olhos curiosos, através de acusações e provas. Já a punição incidirá sobre seu corpo na forma de um espetáculo.
Através do suplício o réu faz brilhar toda a verdade de um acontecimento. Através da dor, ele se confessa, se purga, se salva. Da acusação até o grito final é um caminho delito-verdade-justiça-pena que se completa. A grande questão aqui é que um crime não ataca apenas a vítima, mas ataca o Rei, o Soberano, aquele dos quais todos são súditos. Ou seja, cometer um crime é ofender ao próprio Rei! Eis o problema. Todo criminoso se torna automaticamente um inimigo do Rei, afinal, sua soberania foi desafiada e lesada pelo ato infrator. Logo, é dever do monarca restabelecer sua força e mostrar toda sua glória.
A função do suplício, como podemos ver, é mais que uma questão jurídica, é também política: através do cerimonial de dor e sofrimento o Rei restabelece seu poder lesado por alguns instantes e restaura seu brilho momentaneamente maculado pelo desafio infeliz de um de seus súditos.
Os excessos do suplício eram a maneira de mostrar o quanto era dissimétrica a relação Rei-súdito. O primeiro é todo poderoso, e pode fazer valer a sua força até o extremo, causando a maior das dores e punições possíveis, o outro é apenas um humilde súdito, ordinário, insignificante, mas que ousou provocar a ira do poder real. Todo criminoso é um inimigo da realeza, e precisa ser tratado como tal (por isso a pena por tentativa de regicídio era uma das mais cruéis e temíveis).
As interpretações possíveis são: fim da dor ou dor do fim, prejuízos psicológicos, desgastes, exaustão, sofrimento que chega ao fim, interrupção, suicídio, desistência, abatimento, culpa, traição, ação abortada, destituição, destruição.