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As virtudes Justiça e Temperança no tarô e as confusões conceituais

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No âmbito das interpretações simbólicas é comum encontrarmos textos de alguns autores ou pesquisadores que se perdem no entendimento da essência das imagens. No tarô, as confusões não são raras e o significado de alguns arcanos acaba se mesclando a outros, pela dificuldade do intérprete cruzar a tênue linha entre as esferas simbólicas. Dessa condição surgem as dúvidas que se originam de algumas cartas em especial, como é o caso da “Justiça”, “Temperança” e “Julgamento” que, frequentemente, alunos e praticantes encontram maiores dificuldades na hora da interpretação.

A Justiça no Tarô Visconti Sforza (1451); em afresco de Rafael no Vaticano (1508) e no Tarô de Wirth (1927)

Tomemos como base os arcanos “Justiça” e “Temperança” que se confundem em significados. Esses dois arcanos integram as virtudes cardeais (ou cardinais), que norteiam a humanidade, junto à “Prudência” e “Fortaleza” de acordo com a Igreja Católica Apostólica Romana. O conceito teológico destas quatro virtudes foi derivado inicialmente do esquema de Platão e adaptado por Santo Ambrósio de Milão, Santo Agostinho de Hipona e São Tomás de Aquino. Embora ambas falem de ‘equilíbrio’, cada qual comporta peculiaridades.

“Justiça” (8 no clássico ou 11 no Rider Waite) é um arcano que envolve as leis e códigos de condutas humanas apoiados na normatividade. Diferente do arcano 20 “O Julgamento ou Juízo Final” que envolve as leis divinas, a “Justiça” fala de firmeza e retidão em função de dar e receber o que é de direito. Esse arcano é considerado cármico, segundo alguns esoteristas, na condição de respondermos pelos nossos atos. Mas, não é como o 10 “Roda da Fortuna” que fala de “ação e reação” ou o arcano 20 “O Julgamento” cuja natureza é de “colher o que se plantou”. Aqui fala de Metron, a justa medida segundo os gregos, para não cairmos em Hybris, a desmedida. A “Justiça” opera na equidade em função do respeito aos valores estabelecidos, exige que cada coisa se encaixe no seu devido lugar.

Por sua natureza protocolar, o formalismo marca a tendência de exigir cumprir o combinado e entender que, para direitos existem deveres. Acertos ou prestações de contas acontecem aqui e não é admissível decidir nada segundo o coração: somente pela razão seremos capazes de chegar a um consenso. Aqui não se exige bom senso em si, mas ser obediente e criterioso. Tudo que acontece através desse arcano exige do indivíduo considerar que, ao mexer num prato da balança, o outro automaticamente refletirá a decisão. Como consequência, a pesada espada da figura poderá nos libertar ou nos condenar por atitudes mal pe(n)sadas. De todo modo, é um arcano que cobra o tempo todo entendimento das regras do jogo da vida. Ser justo é mensurar as consequências sempre sobre os demais a partir daquilo que decidimos.

A virtude da Temperança na Igreja de Commana-França (1683); no Tarô Visconti-Sforza (1451)
e na pintura de Edward Burne-Jones (1872)

Já o arcano 14 “Temperança”, o viés está atrelado à moderação. O anjo (ou arcanjo), mensageiro de Deus e protetor dos homens, toca o solo num ato de consagração. Em sua simbólica, podemos encontrar analogias com o arcanjo Rafael, responsável pela cura e restauração. Por outro lado, esse anjo carrega o glifo do sol em sua testa, evocando a luz, clarividência e abertura de consciência. Aqui temos o ato de conservar para não faltar, a água é transmitida de uma taça (ou ânfora) à outra, de forma tranquila ou pacífica. Nada acontece aqui no sobressalto ou sob pressa (ou pressão), devemos conduzir com calma qualquer coisa. O próprio nome “Temperança” carrega em sua estrutura o termo “temperar”, sugerindo moderação. Enquanto na “Justiça” verifica-se o princípio da equidade, nesse arcano temos a proporção. Equidade coloca elementos em pé de igualdade; na proporcionalidade os elementos são dispostos por combinação.


A “Justiça” é métrica; a “Temperança” é simétrica. Outro fator que diferencia um arcano do outro é que a “Temperança” se apoia no tempo e exatidão dos eventos, muitas vezes nos impondo espera ou paciência; já no arcano da “Justiça” o crivo é de decidir ou resolver o que é preciso, visto que se trata de uma figura frontal. Mesmo que ambas apelem para o equilíbrio, no arcano 8 (ou 11) este se faz por meio do cumprimento dos deveres, enquanto no arcano 14 o processo envolve consideração aos limites. Em ambos os casos os arcanos exigem do consulente ações pensadas e tolerância, fundamentais para se atingir o resultado aguardado.

Giancarlo Kind Schmid
Giancarlo Kind Schmid
Vivendo em meio aos livros desde criança na biblioteca de meu pai, despertei interesse logo cedo por Literatura e História. Aos onze anos, comecei a me identificar com História Antiga, mais precisamente Egiptologia e afins. O primeiro contato com o mundo esotérico surgiu das pesquisas feitas com Piramidologia e estudos sobre energia cósmica.

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